DAR UM TEMPO




No modelo moderno de amor, vemos no decorrer do relacionamento muitas pessoas pedindo um tempo. O corre-corre diário nos encaminha por inúmeras atividades, somos tomados por diversos afazeres e não temos tempo para refletir sobre nossas relações pessoais. O “dar um tempo” é a parada para um tempo interno, é a necessidade de parar para compreender o que ocorre no intimo do indivíduo.
Na vida a dois “pedir um tempo” aparece como momento de crise salutar. Quando ouvimos a famosa frase: “vamos dar um tempo”, sentimos que há alguma coisa que precisa ser avaliada, novamente assimilada e compreendida. Ninguém que ama pede um tempo simplesmente por pedir, pede-se na tentativa de compreender melhor. As crises do relacionamento aparecem quando as divergências entre os dois começam a se tornar desconfortáveis. Este incômodo pode ir crescendo e de repente aparecer como dificuldade ou até mesmo impossibilidade de manter o relacionamento. Daí a necessidade de sair um pouco do turbilhão, aguardar que a poeira baixe, e de fora analisar todo o relacionamento.
“Dar um tempo” não é sinônimo de fim de um amor, mas de insistência de uma crise. Toda crise tem um papel purificador. Quando uma crise aparece é preciso se dedicar à crise, não fugir dela. A palavra “crise” vem de acrisolar, purificar, depurar, limpar. Crise diz a ação do crisol, isto é, a ação de limpeza do metal impuro por meio do fogo. No crisol, ouro é colocado em alta temperatura, quando está derretendo todas as impurezas vão saindo como faíscas, até que, depois de muito calor e tempo, aparece o ouro puro, de brilho inigualável. Purificação necessita de tempo e calor.
Quando aparece a crise, temos a tendência de fugir dela, de não nos permitir a purificação que o calor proporciona, pois toda purificação se apresenta como dor e, às vezes, como sofrimento. No relacionamento a dois, não tentamos entender o que se passa, mas simplesmente fugimos da crise. Uns separam, pois querendo evitar as desavenças, permanecem com as mesmas impurezas, estas gerarão em outros relacionamentos outras crises e outras rupturas. Outros buscam um conforto afetivo imediato, assim que terminam a discussão tentam reverter a situação. Não encarando as dificuldades reassumem o mesmo papel anterior. Como se ao colocar o ouro no fogo, sobreviesse o medo de perder o ouro junto com as impurezas, e este medo conduzisse a desistência da purificação. Ou seja, temos a tendência intrínseca de não encarar a crise, ou de fugir dela.
“Dar um tempo” é um convite à crise, é um convite à purificação. Daí a importância de se dedicar ao tempo proposto. O resultado da crise aparecerá como no acrisolamento do ouro, depois muito de calor e tempo aparecerá limpidamente, como o ouro puro, a compreensão do relacionamento. Para descobrir o que realmente é, entender o outro e descobrir se juntos podem construir a vida, é necessário a purificação, a dedicação somente à crise, portanto é preciso manter-se fiel a ela. E quando menos se espera aparece o relacionamento purificado, como o reluzir do ouro puro.