O individualismo e a crise humana

Vivemos o auge da era do indivíduo. Para onde olhamos vemos a queda dos ideais de coletividade. Desde a instituição familiar até as mais ideológicas linhas de pensamento coletivo perderam sua dinâmica interna. As instituições se percebem numa crise interna, esta crise está intimamente ligada ao novo modelo humano que passou a imperar, o humano individualista.
Quando falamos em individuo nos remetemos ao latim, onde se diz “individuu”, que significa aquele é único e indivisível. Ou seja, o indivíduo é algo que é por si e único. Não pode ser cindido nem separado. Na seqüência vemos o surgimento dos termos “individualidade”, que se remete ao modo de ser do individuo, e “individualismo”, que se refere à doutrina, corrente, filosofia, ou seja, uma doutrina do individual. Se fizermos uma analogia com outro termo, por exemplo “cristianismo”, notamos de um lado o “Cristo”, naquilo que ele foi, e de outro lado o “cristianismo”, o modo com que vivem e se relacionam os que crêem em Cristo, percebemos claramente que um nada tem a ver com o outro. O “ismo” se refere à decadência (saída da cadência originária) de um elemento auto-suficiente e forte por si. Daí que a individualidade é valorosa e importante, mas o individualismo se apresenta como fator de permanente atenção, pois pode aparecer de várias formas, criando processos estranhos e perigosos a existência humana.
A individualidade é uma das mais fortes marcas do humano. É ele, enquanto indivíduo, que age no mundo. Contudo, a vida acontece na coletividade, somos um “nó de relações”. Mas, hoje vemos acentuar-se a valorização do individuo, neste processo cada um coloca seus interesses acima de qualquer coisa. Ou seja, a autoridade do individuo está acima de qualquer definição apresentada anteriormente. Os valores universais não estão definidos e claros, pois cada um faz uma leitura do mundo a partir de valores individuais, que nem sempre são consensos humanos.
Todo este movimento pode ser presenciado publicamente na política, onde cada indivíduo busca o melhor para si, defendendo somente interesses particulares. De certo modo o entendimento de “pólis” é novo, pois não se enquadra no ideal de bem comum, mas de adequação ao individual. Assim, as estruturas políticas surgem para servir alguns indivíduos, em suas necessidades especificas, não se atendo às necessidades reais da coletividade.
O que chamamos de corrupção nada mais é do que a cristalização do individualismo na política. O corrupto se coloca acima de qualquer coisa, ele é o único individuo que deve ser beneficiado. Ou seja, nada existe além dele. Neste modo de pensar, onde o individuo é o centro, a punição se torna inútil, pois não age como regeneradora, mas vem motivar novas ações na mesma intensidade.
Vivemos uma crise universal de valores coletivos. “Tudo que era sólido, está desvanecendo no ar” . A humanidade urge por novos valores, por um novo ethos, onde aja um consenso mínimo que garanta a sobrevivência da espécie.

Equilíbrio familiar



Às vezes, paramos para observar os tipos humanos. Não são muitos, mas todos partem de dois princípios básicos, que os orientais chamavam de Yin-Yang. A essência existencial se dá neste processo dual, onde uma única realidade se apresenta de modos diferentes, num colorido autêntico. O equilíbrio está na perfeita vazão destas forças, onde elas não se anulam, mas são plenificadas pela complementaridade.
Assim, o mesmo se apresenta ora como passividade, ora como atividade, não existindo diferença de valor (Bom / Mau) entre eles, mas na união dos dois irrompe a força vital. Na milenar estrutura da família, a mesma dinâmica aparece, nela o pai representa o vigor e a mãe a ternura. Quando existe o perfeito equilíbrio entre ternura e vigor, onde cada um corresponde ao valor que tem, a família se encontra psiquicamente saudável.
No mundo agitado em que vivemos, lentamente estes papeis estão se perdendo. A mãe, que antes trazia o arquétipo da ternura, começa a sobressair como vigor, assumindo os papeis de força e virilidade. O profissionalismo feminino toma o espaço antes destinado à família. Neste processo, a mulher tende a esquecer da ternura e se dispõe a competir com o vigor. Vemos um processo de masculinização do princípio feminino.
O homem, por sua vez, se vê deslocado em seu vigor ficando escondido e velado. Irrompe de outro lado a super-mãe que anseia por um lugar no mercado de trabalho, mas que não pode esquecer do cuidado com os filhos. Este novo movimento está gerando um stress estonteante. A estrutura psíquica, que se mantinha num modo ordenado há milênios, foi fragmentada. Sem juízo de valor, percebemos uma nova dinâmica, onde as famílias se encontram desestruturadas e sem clareza de sua função no mundo.
A crise instaurada por este novo sistema está se refletindo nos filhos. Enquanto os progenitores estão perdidos em seus papeis, os filhos vão nascendo e crescendo sem a clareza necessária para o equilíbrio psíquico. Vemos, por todos os lados, surgir inúmeras doenças psíquicas, muitas, senão a maioria delas, têm sua origem nos primeiros anos de vida. Estas doenças surgem do modo com que os pais se relacionam como família.
Os dois princípios que constituem o universo, Yin-Yang, se bem integrados mantém a harmonia. Assim, como na constituição da família, se a ternura feminina e o vigor masculino estiverem relacionados e forem movidos e direcionados por um amor verdadeiro, perceberemos nela a harmonia que garante a saúde da psique. Assim, já nos ensinavam os gregos: “Na união dos opostos está a mais perfeita harmonia”.

A Irracionalidade da Razão



Em nosso modelo capitalista estamos experimentando o desenvolvimento destrutivista. Em nome do crescimento, da expansão e da atração de capital em vistas do enriquecimento, observamos a destruição do conjunto ambiental, em conseqüência disto a destruição do espaço propício para a vida humana.
Em pouco tempo teremos um planeta superaquecido, imensas regiões desérticas e a inevitável extinção de nossa raça. Isso tudo em nome do desenvolvimento.
Até o final da Idade Média, considerada pela ignorância racional como idade das trevas, tínhamos o ser humano vivendo em perfeita harmonia com seu planeta. Esta harmonia tinha como base a compreensão da divindade como centro de tudo, de onde tudo provém e para onde tudo retorna. Nisto, o homem conhecia seu lugar no mundo e cada elemento era considerado como criatura de Deus, ou seja, todos filhos de um mesmo pai. Alguns eram mais claros e objetivos ao chamar cada elemento que compõe a natureza de irmão, constituindo uma fraternidade universal.
Dentro da grande fraternidade, onde um só era o senhor, uma harmonia típica se dava. Não se tratava de um mundo perfeito, sem problemas e dificuldades, mas sim de um mundo onde a existência se garantia pela pacífica convivência com o natural.
Com o iluminismo fomos visitados pelas luzes da razão, a fé do modelo medieval foi colocada em cheque e desqualificada. Desde aquele momento, o homem se tornou o centro do universo e a divindade passou a ser vista por um outro prisma, o divino foi colocado à disposição do homem.
Após a substituição da fé pela razão, irrompeu a necessidade de dominar, o homem se tornou o senhor de tudo, ocupando o lugar do criador e colocando tudo a sua disposição.
Neste processo o homem é o senhor de tudo e presume controlar todas as coisas. Esta presunção provém da arte científica racional que tudo quer conhecer e tudo quer controlar. Somos guiados por uma ciência que para conhecer um determinado ser precisa destruí-lo, fragmenta-lo e dividi-lo. Portanto, não se trata de uma ciência de vida, mas de morte. Pois para estudar um determinado elemento precisa retira-lo de seu habitat e criar condições artificiais, entretanto a vida em plenitude não se dá no artificial.
O que não percebemos é que esta força não está garantindo nossa sobrevivência. A única coisa que pode manter o equilíbrio da terra, que pode garantir a sobrevivência do homem sobre terra é o retorno ao frugal, ao simples e à compreensão de submissão aos princípios naturais. Onde não estamos acima de tudo, mas somos simplesmente uma parte do todo.