Avanços na Educação

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, 9394/96, trouxe avanço para a organização educacional brasileira. Os principais pontos de avanço foram a maleabilidade no ensino fundamental a constante avaliação e o permanente aperfeiçoamento dos professores.
Os criadores desta lei entenderam que o importante para as crianças é a aprendizagem, não a formalidade metodológica. Assim, não se prenderam a determinar e definir normas rígidas para o ensino fundamental, mas tentaram propor condições reais de aprendizagem, de modo que o aluno tivesse possibilidade de aprender de acordo com a sua realidade local. Assim, a LDB deu espaço para a criatividade, apresentou uma medida metodológica mínima necessária para a educação, sem perder de vista o objetivo principal. Entretanto, nem sempre a instituição se permite à criatividade, assim, mesmo a lei permitindo, os núcleos de educação tiveram dificuldade em se abrir para a renovação e até, a partir de uma interpretação conservadora da lei, contribuíram para o engessamento da educação.
A organização da educação, se em ciclos ou em séries, não era o principal. O importante, para esta lei, era que a aprendizagem apresentasse frutos reais. Por isso, para o sucesso deste processo a lei propõe a avaliação sistemática bem organizada, de modo que a educação como “um todo” pudesse ser acompanhada e seus resultados fossem claramente mensurados.
A avaliação não deve ter o caráter punitivo, deve somente mensurar a aprendizagem, servindo somente de base para uma reflexão. Avaliar, neste contexto, não tem finalidade em si, sua função é perceptiva, por ela o professor tateia a aprendizagem dos alunos e percebe onde é necessário melhorar. Assim, o sistema avaliativo surge como possibilidade onde o professor recebe feedback de seu trabalho. Hoje, detectamos a dificuldade na aplicação deste sistema devido à falta de preparo dos professores, que se mantiveram viciados na estrutura antiga, onde a avaliação tem uma função positivista que segrega os alunos entre melhores e piores, definindo-os a partir de valores números. A fusão entre os professores mal preparados e a novidade da LDB gerou um caos no ensino fundamental, assim alguns alunos chegam ao quarto ano de estudo sem estarem devidamente alfabetizados.
Mas a proposta da LDB previa a preparação dos professores. A formação constante e a contínua retomada do estudo pretendiam dar ao professor os subsídios necessários para o trabalho. Somente professores devidamente preparados são capazes de colocar em prática as propostas da educação brasileira. Mas esta preparação não deve se prender à mera instrução intelectual, como ocorre hoje, é necessário que o professor seja uma pessoa integra de fato e que tenha suas questões bem resolvidas. Assim, ele necessita que o estado lhe proporcione a formação constante e a remuneração justa.

Hanseníase e Franciscanismo


“O Senhor assim deu a mim, Frei Francisco, começar a fazer penitência: porque, como estava em pecados, parecia-me por demais amargo ver os leprosos. E o próprio Senhor me levou para o meio deles, e fiz misericórdia com eles. E afastando-me deles, aquilo que me parecia amargo converteu-se para mim em doçura da alma e do corpo; e depois parei um pouco e saí do século”[1].

Todo o processo vital de Francisco se dá a partir do momento em que o Senhor o coloca diante da lepra. Não outra pessoa, nem outro homem, nem outra coisa que o próprio Senhor. Ou seja, o Deus de Francisco o leva a deparar-se com a doença e neste momento encerra-se graciosamente o processo de conversão e Frei Francisco vê toda a dor se tornar luz.
Francisco diz que o fato de viver em pecado fazia com que visse nos leprosos o amargo, o difícil, o azedo. Para o medieval o amargor tem a ver com tudo quanto há de ruim, quanto há difícil. O pecado consiste em não amar tudo aquilo que os olhos tocam, ou seja, o pecado consiste em não amar o amor. Então os primeiros encontros de Francisco com os leprosos são cheios de dor e sofrimento, pois Francisco ainda não tinha aprendido a lição vital do amor, isto é, a lição do próprio Deus, “porque, como estava em pecados, parecia-me por demais amargo ver os leprosos”.
Quando Francisco entende o chamamento de Deus para o amor, ele compreende que não há impureza nos leprosos, que não há maldade neles e compreende que “Tudo é puro, aos olhos dos puros”. Essa pureza no olhar, no fitar, dá para Francisco a abertura para amar tudo o que seus olhos tocam. Seus primeiros amados passam a ser os leprosos. O pecado não está nos leprosos, mas em quem vê os leprosos, na atitude julgadora e restritiva imposta pela sociedade. Francisco percebe a farsa da sociedade, suas mazelas e suas falsidades, suas mentiras e interesses. Por isso, ele decide ir ao fundo, ele realmente decide amar tudo o que os olhos tocam.



“E o próprio Senhor me levou para o meio deles”

O próprio Deus o encaminha para o meio dos leprosos. Francisco não vai lá para apresentar seus títulos de nobreza e o poder financeiro do pai. Ele vai lá para viver entre os leprosos, ele vai até lá para entregar-se aos mortos da sociedade, ele vai lá para morrer com a morte conferida aos leprosos. Francisco não vai ensinar nada, ele vai simplesmente para ser um deles, para se tornar um deles. Francisco se faz leproso com o leproso.

Os Leprosos na Idade Média

Os medievais convivem com a lepra por muitos séculos, os historiadores discutem a proveniência desta doença, mas ninguém sabe ao certo de onde ela havia surgido. Como era difícil um diagnóstico, ela era confundida com doenças de pele e venéreas. Assim, o afastamento dos leprosos era visto como a possibilidade de afugentar o símbolo vivo do pecado, da lascívia e da promiscuidade. A lera era a marca do pecado, a pele apresentava a alma corrida pelo erro.
A identificação era feita por meio de denúncia, lembremo-nos que o leproso era o mais vil dos pecadores, todos tinham o dever de denunciar quem apresentasse uma mancha na pele, para que o tribunal fosse instaurado. Então, o doente era colocado diante de um júri composto por um médico, um representante do estado e um padre. Assim, Ciência, Estado e Igreja, examinavam minuciosamente a pele do indivíduo. Então haviam muitos métodos de diagnosticar a doença, “Um deles afirmava que se pusesse uma pessoa ao luar, de forma que os raios lhe batessem na face, o leproso ficaria marcado por diversas cores, enquanto que o homem saudável pareceria pálido. Um outro dizia que se espalhasse cinzas de chumbo queimado na urina de um leproso, elas ficariam a boiar, enquanto, normalmente, cairiam no fundo do recipiente.”
Com estes exames muita gente era considerada leprosa. Após o julgamento o leproso devia se afastar do convívio social, era muito vergonhoso ter parentes leprosos, a distância deles mantinha a pureza do homem. Com este fim, era realizada a última cerimônia da vida do leproso, era o último momento público dele. O doente era levado em procissão até uma igreja ao canto do “Liberta-me”, do espaço montado para ele, um espaço que o mantinha distante dos demais, assistia sua cerimônia exequial (cerimônia dos defuntos). O Ritual previa o seguinte: "o padre deve ter uma pele (luva) na mão e com essa pele deve pegar terra do cemitério, três vezes, e pô-la na testa do leprosos, dizendo o seguinte: Meu amigo, é sinal de que estás morto para o mundo e por isso tem paciência e louva em tudo a Deus."[2]
Após isso o Padre abençoava os sinos, as luvas e a caixa de esmolas que o leproso deveria carregar para que assim fossem reconhecidos pela sociedade. Então, o padre lia a lista de proibições, onde o leproso estava proibido de tocar os alimentos, de entrar nos moinhos, etc. Depois desta macabra cerimônia, os leprosos eram banidos e iam vivem em leprosarias. [3]

“E tive misericórdia com eles”

Nas palavras de Francisco ele não diz que teve pena ou dó dos leprosos, ele diz que teve “Misericórdia com eles”. Misericórdia é uma atitude medieval de entrega e amor. Misericórdia vem de duas palavras latinas miser + cordis, que significa coração simples, coração puro. Francisco vai para aprender com os leprosos a pureza de coração. São os leprosos que ensinam Francisco a ter nas mãos o coração e com o coração simples amar o amor. A lepra é a escola humana de Francisco. Francisco deixa sua riqueza, seus bens, a rica sociedade medieval e vai viver entre os mortos. O mortos mostram a Francisco o dom do amor, o dom da misericórdia.
Lá no meio da fedentina, das feridas, das chagas, Francisco se encontra nu diante do Cristo nu. Francisco encontra o Cristo pobre entre os pobres, diferente do Cristo apresentado pela Igreja da Época que era um Cristo rico, luxuoso e guerreiro. Irrompe no seio da Idade Média um homem que vem resgatar o amor, resgatar os valores do humano.
Ter misericórdia com eles mostra que Francisco assumiu até o fim seu amor pela lepra e em amar se deixou ser amado, assim envolveu-se num esponsal de amor. Decidindo casar-se com a pobreza dos leprosos, com as dores deles. Francisco desposa a Senhora Dama Pobreza. Ele encontra entre os leprosos um valor que a sociedade via como desvalor, ele descobre que o causador de tanto sofrimento é o dinheiro e percebe que pode viver, como os leprosos, muito bem com pouco ou até sem dinheiro. Francisco aprende dos leprosos o amor à Dama Pobreza.

“Aquilo que me parecia amargo converteu-se para mim em doçura da alma e do corpo.”

O leproso faz com que Frei Francisco mude a chave de leitura, a dor da pobreza se torna graça, benção. Tudo que parecia ser dolorido, amargo e difícil se torna doce e saboroso. O leproso continua no seu caminho, porém muda em Francisco o modo de olhar, muda nele a possibilidade de ver. Ele passa a amar tudo que os olhos tocam. Assim, o mal cheiro, as doenças, as dificuldades dos leprosos não são mais insuportáveis, não são mais amargas, são somente possibilidade de crescimento, são possibilidade de amar, são possibilidade de desenvolvimento.

“E depois parei um pouco e saí do século”

Este encontro faz com que ele mude de vida, com que ele assuma um novo caminho, um novo mundo se abre. Francisco se apresenta como novo homem, pois quem aprendeu a amar o amor, quem aprendeu a amar tudo que os olhos tocam, aprendeu que na vida o importante é a simplicidade de coração. Assim, para quem descobre que tudo é puro para quem tem olhos puros, não há volta, o mundo tem um novo colorido, as pessoas, as cores, os homens, os animais, as florestas, tudo é repleto de sentido e significado.





O PROJETO: FRANCISCANOS PELA ELIMINAÇÃO DA HANSENÍASE

O projeto de eliminação da hanseníase no Brasil não é propriamente dos franciscanos, mas queremos somar nossas forças para colaborar com o Governo e com outras entidades, que já estão trabalhando nesta área há muito tempo. Na verdade, esta motivação já vem desde o tempo de nosso fundador, São Francisco de Assis, no encontro que teve com os leprosos que o levou à superação de si diante das mazelas do mundo.
Além disso, o Brasil é o segundo país do mundo em casos de hanseníase, uma doença que existe desde os tempos bíblicos, uma doença que tem cura. E que de acordo com material divulgado na imprensa, a Brasil, numa questão percentual, é o país com maior incidência de casos em todo mundo.[4]
Assim, um sonho brota no seio dos franciscanos, a eliminação da hanseníase como um presente à humanidade. Como uma atitude reverente para que o sofredor deixe de sofrer, para que a morte se torne vida e vida plena. Portanto, este projeto leva os franciscanos ao centro do carisma de seu fundador, faz com que eles encontrem, como fizera Francisco, a doçura da cura no amargor da doença.

[1] Testamento de São Francisco de Assis.
[2] Cf. LE GOFF, Jacques. As doenças têm História. Lisboa: Terramar, 1996.
[3] Cf. RICHARDS, Jeffrey. Sexo, Desvio e Danação. As Minorias na Idade Média. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993. & Cf. GINZBURG, Carlo. História Noturna: Decifrando o Sabá. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
[4] Cf. KOENIG, Augusto. Franciscanos pela erradicação da hanseníase. Disponível em: http://www.franciscanos.org.br. Acessado em: 29/05/2006.